
Lucas tem apenas seis anos de idade e uma surpreendente noção de certo e errado.
Há três anos, lhe contei a história do Chapeuzinho Vermelho. Na época, influenciada pelas crÃticas quanto à violência nos contos infantis, decidi mudar o final da narrativa. Disse que o caçador trancou a vovozinha no armário.
Após me ouvir atentamente, sem nenhuma interrupção, olhou nos meus olhos – este é um dos seus traços – e falou com firmeza: “Eu vou embora e, quando voltar, vou trazer uma faca para cortar sua bocaâ€. Cortar a minha boca? Perguntei, espantada. “Sim, porque você falou mentira – o caçador não trancou a vovozinha no armário, ele matou e comeu a vovó.â€
Para ele, Chapeuzinho Vermelho era apenas uma história inventada onde tudo era permitido e possÃvel, mas falar mentira na vida real era imperdoável.
Soube que na última semana, durante uma partida de futebol, um adulto presente na sala brincou, jocosamente, com a negritude da maioria dos jogadores de um time. Ele, negro, com senso crÃtico já apurado, retrucou: “Você sabe, fulano, que isso que está fazendo é bullying?â€
Deixou claro que a brincadeira imprópria, por ser depreciativa, resultava da ignorância e merecia um toque de alerta.
Há cerca de um mês, peguei uma revista e pedi que lesse umas palavras. Não conseguiu, ficou desconcertado, deu um jeito de escapulir. Uma semana depois, voltou e, como quem não quer nada, olhou para uma bolsa impressa, perguntando se eu sabia o que estava escrito. Devolvi a pergunta e foi precisa a resposta. Acertou.
Tinha consciência da importância da leitura, correu atrás do prejuÃzo e, em tempo recorde, mostrou resultado. Agora, à vontade com as letras, já lê de carreirinha feito o Zelão da novela, confiante no próprio desempenho e todo orgulhoso de si.
Ontem, sua mãe me disse que a diretora da escola a chamou para elogiar seu progresso. Está se destacando na turma, o que não me surpreende. Lucas é uma criança, dentre tantas neste paÃs, que reforça a esperança de uma sociedade melhor, produzida com mais qualidade.
Creio que se nós facilitarmos, ou não atrapalharmos demais, pode até acontecer rapidinho. Tomara!
*Denizi de Paula Oliveira é médica, anfitriã e mentora do programa Belas Conversas, no Espaço Pessoa Bonita
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Nesse dia tão especial, cabe essa beleza de reflexão. Uma homenagem ao meu pai, que há pouco libertou o hálito das marés agitadas, levantou-se, expandiu-se e livremente foi ao encontro de Deus…
“Então, Almitra falou, dizendo: GostarÃamos de interrogar-te a respeito da morte. E ele disse: Quereis conhecer o segredo da morte. Mas como podereis descobri-lo se não o procurardes no coração da vida? A coruja, cujos olhos, feitos para a noite, são velados ao dia, não pode descortinar o mistério da luz.
Se quereis realmente contemplar o espÃrito da morte, abri amplamente as portas do vosso coração ao corpo da vida. Pois a vida e a morte são uma e a mesma coisa, como o rio e o mar são uma e a mesma coisa. Na profundeza de vossas esperanças e aspirações dorme vosso silencioso conhecimento do além; e como sementes sonhando sob a neve, assim vosso coração sonha com a primavera. Confiai nos sonhos, pois neles se ocultam as portas da eternidade.
Vosso temor da morte é semelhante ao temor do camponês quando comparece diante do rei e este lhe estende a mão em sinal de consideração. Não se regozija o camponês, apesar do seu temor, de receber as insÃgnias do rei? Contudo, não está ele mais atento ao seu temor do que à distinção recebida?
Pois, que é morrer senão expor-se, desnudo, aos ventos e dissolver-se no sol? E o que é cessar de respirar senão libertar o hálito de suas marés agitadas, a fim de que se levante e se expanda e procure a Deus livremente? É somente quando beberdes do rio do silêncio que podereis realmente cantar.É somente quando atingirdes o cume da montanha que começareis a subir. É quando a terra reivindicar vossos membros que podereis verdadeiramente dançar.â€
Do livro O PROFETA de Gibran Khalil Gibran.
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